Ele ainda é presidente

27 de setembro de 2009

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O ex-presidente americano Bill Clinton está constantemente em campanha. Força do hábito, para quem nunca saiu do cenário político mundial. Por isso, na terça-feira, 22, o curto espaço que o separava da porta da limusine à uma entrada de serviço do Hotel Sheraton, na rua 52, em Manhattan, tomou-lhe 18 minutos cravados. Dedicou o tempo a um afã de apertos de mãos, fotos com admiradores e, até, a resposta à uma pergunta não muito simpática de CartaCapital. “Existem críticos que qualificam seu trabalho na Clinton Global Initiative como benemerência de uma oligarquia sem representação eleitoral. O que o senhor tem a dizer sobre isso?”. Sem deixar de sorrir, Clinton respondeu: “Dentro deste hotel estão cerca de 100 líderes mundiais- a maioria eleita democraticamente por seus conterâneos. E mesmo se estivessem ausentes, é preciso considerar que se aqueles que receberam votos não atuam para a melhoria da qualidade de vida de seus constituintes, alguém tem de tomar o seu lugar”, disse.

Esta pergunta e resposta remeteram a ponderações que Clinton faria mais tarde sobre dados apresentados pela presidente chilena, Michelle Bachelet. Ambos faziam parte do painel de abertura do evento patrocinado pela Clinton Global Initiative, entre os dias 22 e 25 passados. Ao saber que os chilenos têm cobertura de seguro saúde universal, o ex-presidente americano perguntou qual era a renda per capita dos cidadãos do país. Bachelet disse: “US$ 13.500”. Clinton, então, atacou: “Se eu fosse congressista americano, ficaria envergonhado com o fato do Chile poder assegurar todos os seus cidadãos, e eu não no meu país”.

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A tirada foi um dos pontos mais comentados da abertura da conferência reunindo lideranças políticas, empresariais, ONGs, celebridades e instituições empenhadas na filantropia em áreas de desenvolvimento sustentável no mundo. Cada participante da Clinton Global Initiative se compromete a encontrar soluções para problemas e colocar em prática iniciativas práticas. Os esforços concentram-se em quatro tópicos abrangentes. Estas metas são: Energia e Mudanças Climáticas; Educação; Saúde Global; e Combate à Pobreza.

O tema principal desta conferência de 2009 foi “Elevação das condições de mulheres e meninas”, mas os outros assuntos também foram debatidos em painéis de convidados especiais. A arrecadação de fundos é, evidentemente, outro propósito fundamental da empreitada. Até este encontro, US$ 2.3 bilhões haviam sido amealhados. Espera-se que a caixa suba agora aos US$ 2.5 bilhões,

“Desde o lançamento da fundação, em setembro de 2005, cerca de 200 milhões de pessoas foram beneficiadas em todo o mundo”, diz Robert Harrison, executivo-chefe da instituição. “As iniciativas atingem 100 países e arregimentamos, até esta reunião, 1.400 participantes compromissados”, diz Harrison. Aqui, o vocábulo “compromisso” é considerado ao pé da letra: trata-se de substantivo. Quem não cumprir com as metas a que se obrigou, não é convidado para o próximo evento da CGI.

Neste encontro de 2009, temia-se que a turma de barrados no baile fosse aumentar muito, devido à recessão. Afinal, várias instituições de caridade perderam apoiadores e tiveram de fechar as portas. Mas Harrison assegura que o desastre está sendo evitado. “Compromissos assumidos para serem levados a cabo em três anos, vão agora necessitar de cinco anos. Os de cinco anos exigirão sete. Mas já sabemos que as iniciativas vão continuar, e estamos nestes dias recebendo mais adesões”, disse Harrison. Ele citou como exemplo, a primeira contribuição de empresa brasileira. O Grupo ABC, capitaneado por Nizan Guanaes começou a colaborar.

As questões principais discutidas na cúpula da CGI ecoavam àquelas manifestadas do outro lado de Manhattan, na abertura da Assembléia Geral das Nações Unidas. Concomitantes, os dois encontros foram marcados por preocupações com o esfriamento da economia global e o aquecimento climático. As esperanças de leste a oeste da cidade estavam voltadas para duas reuniões. A do G20, em Pittsburgh, com chefes de Estados e ministros da economia tentando acertar políticas multilaterais e engordar em definitivo o G8, grupo das oito países mais ricos. Também antecipava-se o que poderá ser decidido durante o encontro do Clima em Copenhague, em dezembro. O futuro das ações da ONU e da CGI, depende do que sair desses dois debates internacionais.

Talvez o melhor exemplo de tais preocupações estivesse materializado na figura do primeiro-ministro australiano, Kevin Rudd. Enquanto ele participava do evento, Sydney e outras cidades de seus país estavam mergulhadas numa núvem de poeira gigantesca, originada na seca excepcional deste ano na Austrália. O ex-vice-presidente americano, Al Gore, e 16 cientistas ganhadores do Prêmio Nobel, presentes na conferência, concordavam que a causa do fenômeno é o aquecimento Global. O ministro Rudd, porém, não se limitou apenas à questão da redução de emissões de carbono. Partiu também para a defesa da organização de uma nova ordem econômica mundial. “Não faz sentido uma instituição econômica- o G8- que exclui a China, Índia, Brasil e países muçulmanos, Com a chegada das economias emergentes, a balança do poder mudou”, disse Rudd à Carta Capital. Lembrou também que a ONU, com seus 192 membros, não é o forum mais eficiente para tomada de decisões rápidas, e o G20 estaria mais apto para enfrentar emergências.

O ex-Secretário Geral das Nações Unidas, Kofi Annan, encabeçando o painel sobre “A revolução verde na África”, foi além em suas expectativas. Insistiu que é necessário um acordo abrangente na Rodada de Doha. “De que adianta uma revolução agrícola africana se a produção resultante está barrada por tarifas impostas por países da Europa, Ásia e os Estados Unidos?”, disse Annan. Ele assegurou que os programas de crédito a pequenos e médios produtores, patrocinados por membros da CGI, estão sendo implantados dentro das metas estabelecidas e vão crescer ainda mais. Os resultados estão sendo colhidos em todo o continente. Mas é fundamental a abertura do mercado global.

O ator Matt Damon, participante da fundação com sua Water.Org, diz que os progressos econômicos na África e em outros continentes, vêm acompanhados de melhoria no saneamento básico e distribuição de água potável entre as populações. A ONG que ele encabeça trabalha junto com a CGI para levar, atualmente, estes benefícios a 200 mil pessoas. Mas Damon disse à CartaCapital que seu trabalho seria muito facilitado por um acordo na Rodada de Doha. “Um compromisso entre países nesse processo pode revolucionar não apenas o mercado global, mas também, e mais importante, trazer grandes avanços na manipulação sustentável da água e melhoria sanitária em todos continentes. Atualmente temos um bilhão de pessoas sem água, e dois bilhões sem saneamento”, disse.

Enquanto um acordo na Rodada de Doha não se concretiza, Bill Clinton faz seus acertos paralelos. O prestígio do ex-presidente voltou a patamares elevados. Tanto que na abertura do encontro o presidente Barack Obama- cuja agenda nestes dias é a mais carregada do mundo- fez discurso elogioso e bem humorado sobre a CGI. Na platéia, estavam cabeças coroadas, como a belíssima rainha jordaniana Rania Al-Abdullah, e até o ex-vice-presidente americano Al Gore, que mantinha relações estremecidas com Clinton, desde as eleições presidenciais de 2000. E é dele a melhor frase sobre a influência de Clinton: “Bill conseguiu trazer para estes encontros a eficiência que falta à Assembléia das Nações Unidas”.

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